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Papo de Fera
[Papo de Fera #3] Patriarcado e acumulação em escala mundial, de Maria Mies
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[Papo de Fera #3] Patriarcado e acumulação em escala mundial, de Maria Mies

e a importância da autonomia feminista

Olá, ouvintes, como estão?

Em junho, nós batemos um papo sobre Patriarcado e acumulação em escala mundial: mulheres na divisão internacional do trabalho, obra escrita por Maria Mies e publicada originalmente em inglês em 1986, e hoje vocês podem ouvir essa conversa na íntegra.

Maria Mies foi uma socióloga alemã, nascida em Steffeln, Alemanha, no ano de 1931 e faleceu em maio de 2023, deixando um grande legado para o movimento de mulheres. Foi professora emérita da Universidade de Ciências Aplicadas de Colônia e nos deixou importantes obras como: The Lace Makers of Narsapur [As rendeiras de Narsapur] (1982), Women: The Last Colony [Mulheres: a última colônia] (1988) e The Subsistence Perspective [A perspectiva de subsistência] (1999). 

Além de ter sido um exemplo de combatividade anti-capitalista, anti-patriarcal, anti-colonial e anti-globalização, também deixou construções concretas para a luta das mulheres, como a construção do primeiro abrigo para mulheres vítimas de violência em Colônia, segundo da Alemanha e o primeiro auto gerido pelas próprias mulheres, bem como proposições de novas formas de organizar a produção e a reprodução da vida.

Com uma base de análise materialista e perspectiva de libertação anarquista, Mies impressiona por sua didática, capacidade de síntese e brilhantes críticas às limitações da teoria socialista proposta por Marx e Engels. Elaborando a partir da obra de Rosa Luxemburgo, Maria Mies demonstra a imprescindibilidade da acumulação primitiva permanente para extração de mais-valor, o que se traduz na superexploração do trabalho das mulheres, das colônias e da natureza.

Envolvida diretamente com o movimento feminista ao longo de toda sua vida, não falta também o olhar aguçado a respeito da iminência da cooptação do movimento feminista por parte da agenda desenvolvimentista do Norte global – por meio da institucionalização promovida por organizações internacionais e universidades, e da inserção das mulheres na cadeia mercadológica neoliberal –, que se traduz em uma perda cada vez maior da autonomia política do feminismo, como podemos perceber nos dias de hoje.

Em Patriarcado e acumulação em escala mundial, Mies investiga a conexão entre a divisão sexual do trabalho e a divisão internacional no trabalho na contemporaneidade, oferecendo uma perspectiva anti-colonialista para o movimento de mulheres. Alguns pontos-chave desta obra são o conceito de donadecasificação, a tese do patriarcado capitalista e a perspectiva de subsistência. Para Mies, a contrapartida direta para a proletarização dos homens na transição para a economia capitalista foi a transformação das mulheres em donas de casa. Ela também reconheceu a relação intrínseca entre a exploração histórica das mulheres e a manifestação mais atual desse sistema, que se traduz na economia capitalista em sua fase neoliberal. Além disso, a união entre sua participação direta nos movimentos de mulheres no Terceiro Mundo e sua experiência de vida no campo na Alemanha a permitiram formular uma noção feminista de trabalho que seja capaz de desestruturar a economia patriarcal exploratória, baseada na produção de mercadorias e capital, para, então, conceber uma transição para uma economia de subsistência.

Esperamos que vocês gostem desse episódio e tragam também seus feedbacks a respeito dessa conversa e dessa importante obra de Maria Mies. A edição que utilizamos foi traduzida pelo coletivo Sycorax e publicada pela Editora Timo. Vocês podem adquirir um exemplar no site da Ema Livros ou acessar a versão gratuita em PDF.

Vocês podem conferir também outros textos de Maria Mies traduzidos em português nos links a seguir.

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O matricídio pós-moderno
O texto abaixo é a tradução de um enxerto do artigo Liberating Women, Liberating Knowledge: Reflections On Two Decades Of Feminist Action Research, escrito e publicado por Maria Mies em 1996 na Atlantis, vol. 21, número 1. Embora seja um texto de quase três décadas atrás, ele é ainda mais atual do que quando foi escrito. As coisas escalonaram bastante n…
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origens sociais da divisão sexual do trabalho
Origens sociais da divisão sexual do trabalho* Por Maria Mies Versão original: "Gesellschaftliche Ursprünge der geschlechtlichen Arbeitsteilung", Capítulo segundo de Patriarchat und Kapital: Frauen in der internationalen Arbeitsteilung. Zürich: Rotpunktverlag, 1988…
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Sobre um movimento feminista de classe média
Depois de ler algumas experiências prévias das mulheres nos movimentos socialistas e anarquistas na URSS, na Revolução Espanhola, nas organizações da Primeira Internacional, na luta curda, entre outras, notei a enorme similaridade com a narrativa atual da esquerda brasileira onde o próprio movimento “proletário”, ou seja, os sujeitos politicamente orien…
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o neopatriarcado e as fábricas de gente
Olá, mulheres, como estão? A decodificação dessa semana é a tradução do texto Why do we need all this? A call against genetic engineering and reproductive technology, de Maria Mies, parte da coletânea Made to order: the myth of reproductive and genetic progress…
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as ciborgues não nasceram de um ventre?
O texto a seguir é um trecho do capitulo “Women’s Liberation and Subsistence” [Libertação das mulheres e subsistência], do livro The Subsistence Perspective: Beyond the Globalised Economy [A perspectiva de subsistência: Além da economia globalizada], de Maria Mies e Veronika Bennholdt-Thomsem, distribuído pela Zed Books e pela Spinifex Press em 1999…
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mulher, natureza e a divisão internacional do trabalho
Hoje pela manhã uma amiga compartilhou este email da Ariel Salleh que recebeu em um grupo de pesquisa do qual faz parte. Salleh foi companheira intelectual de Mies e está entre as feministas ecológicas de tradição marxista. Como entramos no mês do meio ambiente, achei oportuno abri-lo com a conversa de duas mulheres as quais muito admiro e muito influen…
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Relembrando e homenageando Maria Mies
Veronika Bennholdt-Thomsen gentilmente compartilhou comigo a eulogia que proferiu durante o funeral de Maria Mies, sua companheira na luta feminista e amiga íntima, para que eu pudesse traduzi-la para o português e compartilha-la com vocês. Mies faleceu em maio deste ano e, como a própria Veronika afirma, sua morte marca o fim de uma era para o moviment…
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Discussão sobre este podcast

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Papo de Fera
O Papo de Fera é um podcast mensal onde Ana (fêmea feroz) e Marina Colerato (lado b) traçam diálogos a partir da leitura conjunta de obras feministas. Essa empreitada surge a partir das trocas, angústias e aspirações acerca da necessidade de disputarmos a narrativa pública sobre feminismo, mulheres e práticas de libertação desde uma perspectiva ecofeminista socialista.