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Texto incrível! Me identifiquei muito com a tua experiência em curso de CHS em universidade pública. Desde os meus primeiros contatos com o conceito de gênero e introdução aos "estudos de gênero" pioneiros de mulheres, especialmente as antropólogas, entendo este como uma imposição/opressão ao corpo sexuado, de modo que não se trata de uma "identidade" ou "escolha", mas daquela camada cultural/social construída a partir de uma materialidade dada e que envolve uma relação de poder e violência do corpo sexuado masculino sobre o feminino. Ok, entendido dessa forma, nunca consegui assimilar os escritos de Butler e outros teóricos que tratam o gênero como uma identidade, performance e etc, mas por ver que esse tipo de literatura é o que domina os centros de pesquisa em CHS, acabei não me dedicando mais a leituras que tratassem sobre o tema, por não encontrar entre os pares sugestões, textos, livros, artigos que fossem contrários a essa visão do gênero como identidade. E sempre me sentindo ignorante, como tu colocou, como se a forma como eu penso fosse atrasada e errada. Me formei em História há alguns anos, pesquisei questões da história política - lembro que no meu ano de tcc, eu fui uma das poucas mulheres - e acho que a única mulher lésbica - que não pesquisou temas relacionados aos "estudos de gênero" -, mas sinto que acabei me afastando tanto tempo dos estudos e das leituras sobre esses temas - ao ponto de até questionar se eu realmente ainda me identificava com o feminismo - em virtude dessa falta de contraponto que existe hoje nas pesquisas de sexo, gênero e sexualidade nas universidades do Brasil e, pelo visto, mundo afora, e dessa apropriação do feminismo pelo transativismo. Inclusive, muito próximo do meu ano de formatura, um ou dois anos antes, lembro de uma colega de curso que fez um tcc sobre "pós-pornografia" com direito a uma performance bizarra, mas não consegui externalizar aquilo entre as demais colegas porque todo mundo achou lindo e revolucionário. Esse pessoal pode achar que é porque sou conservadora, porque sou moralista, porque sou sei lá o que quiserem pensar, mas agora, mais segura após ler tanto do seu trabalho e das demais referências que vc traz somado a um amadurecimento meu e também das minhas ideias e visões de mundo - faz 6 anos que me formei, na época eu era apenas uma jovem entrando na vida adulta com seus 18-22 anos e sem saber formular exatamente como eu pensava essas questões -, sei que minha posição em relação a esse tipo de abordagem não tem nada a ver com isso, mas sim porque enxergo nessa concepção teórica - se é que podemos falar assim - a manutenção da objetificação das mulheres, dos estereótipos e papéis de gênero e da normalização de coisas absurdas, que chegam até a doer o estômago quando a gente lê tudo o que está envolvido na agenda queer. De fato, quando lembro daquelas experiências lá da graduação e de ver que uma colega defende que "pós-pornografia", "pornoterrorismo" e todas essas bizarrices são formas de transgredir e romper com as violências de gênero, é porque chegamos num período de apagamento das mulheres por aqueles que dizem serem mulheres e não aceitam que mulheres se autodenominem mulheres, e quem apontar o absurdo disso ainda será chamado de transfóbico pra baixo. Enfim, acho teu trabalho incrível e é incrível encontrar pessoas que ainda pensam e ajudam os outros a pensar. Agradeço demais pela oportunidade de voltar a pensar sobre esses temas e por saber que não estamos sozinhas.

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Andreza, o memoricídio que se dá contra o pensamento das mulheres é estarrecedor. Há muitas autoras falando sobre a importância de uma análise que se baseia na materialidade da diferença sexual, mas o signo do feminismo, como você pontuou, foi usurpado da luta organizada das mulheres para se transformar em um sinônimo de uma teoria que hoje serve aos interesses dos homens. Infelizmente, acabamos percebendo em nossa trajetória que a universidade não é um ambiente revolucionário, mas um espaço onde a lógica patriarcal permanece e se difunde através de intelectuais escolhidos a dedo.

Um abração em você e fico feliz que o conteúdo que está aqui tenha te ajudado de alguma forma. <3

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Que texto sensacional!

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